sábado, 18 de junho de 2011

Aquela dança



"Dançarás - disse o anjo
Dançarás com teus sapatos vermelhos
Dançarás de porta em porta
Dançarás, dançarás sempre."
Andersen: Os Sapatinhos Vermelhos


Eles dançavam. Foi instintivo. Não teve pedido, não teve cumprimento. Não teve aquela formalidade necessária de quando as pessoas se conhecem e a vida se cruza e as palavras fazem-se obrigatórias e os abraços... e aquela formalidade ilógica. Aquela formalidade não era necessária àquela dança. Aquelas pessoas não se conheciam. Não naquela dança. Isso era novo para os dois.

Pé frente ao outro, jogadas sutis de braços, quadris que se remexiam... Não dançavam porque sabiam. Não sabiam: nem ele, nem ela. Eram aprendizes. Dessa dança sabiam pouco e queriam muito.
E foram querendo dela tudo o que ela conseguiu dar. E se conheceram aprendizes nessa dança como quem já sabe dançar.

Silenciosa. Descobriram que dança boa é sem palavras. As palavras interrompem a respiração, interrompem o ofego, interrompem o instinto. As palavras, muitas vezes, pedem compreensão. Compreender, naquele instante, era pisar no pé, errar um passo. Talvez, pior: compreender era tropeçar e cair.

Passos dados, ainda ofegantes, os dois se separaram. Separação sem despedidas, sem formalidades, sem abraços. Bom assim, simples assim.

Dias depois, dela eu não sei. Ele? Tentou dançar, tropeçou e caiu.